No episódio #1482 do Inteligência Ltda., Rogério Vilela recebeu o historiador Thiago Braga para uma análise aprofundada sobre um dos acordos mais polêmicos do século XX: o pacto de não agressão entre Adolf Hitler e Joseph Stalin, assinado em 1939. Com uma abordagem crítica e embasada em documentos históricos, Braga desmonta narrativas ideológicas e revela os bastidores geopolíticos que uniram temporariamente dois regimes totalitários antagônicos.
Thiago Braga: O Historiador que Desafia Narrativas
Thiago Braga é pesquisador, escritor e criador de conteúdo especializado em história política e militar. Com pós-graduação em Ciências Humanas (História, Filosofia e Sociologia), ele se destacou por suas análises sobre regimes totalitários, com ênfase no comunismo soviético e no nacional-socialismo alemão. Seu trabalho combina rigor acadêmico com uma linguagem acessível, o que o tornou referência em canais como Impérios AD e Brasão de Armas.
Durante o podcast, Braga deixou claro seu método de pesquisa: “Não apresento nada de novo, mas reúno fontes primárias e estudos acadêmicos sérios que muitas vezes são ignorados no Brasil”. Seu livro Mitologia Soviética: Os Mitos Fundadores do Comunismo Russo (Editora Dialética, 2025) foi citado como base para a discussão. A obra, fruto de anos de estudo, confronta versões romantizadas da Revolução Russa e expõe mecanismos de propaganda do regime soviético.
Sobre críticas de que “não é historiador”, respondeu com ironia: “Prove que eu não sou. Meu trabalho está em livros, artigos e canais com milhões de visualizações. Quem ataca minha credibilidade geralmente não tem coragem de mostrar o rosto”.
O Pacto Hitler-Stalin: Mais que uma Aliança Temporária
O episódio concentrou-se no pacto Ribbentrop-Molotov, tratado de não agressão entre nazistas e soviéticos que dividiu a Europa Oriental em esferas de influência. Braga explicou: “Esse acordo não foi um mero casamento de conveniência. Foi uma colaboração estratégica que incluiu troca de tecnologia militar, suprimentos e até campos de extermínio”.
Contexto Histórico e Interesses Comuns
Antes de 1939, Stalin via a Alemanha nazista como uma “ameaça capitalista”, enquanto Hitler classificava o comunismo como “um vídeo judeu-bolchevique”. Porém, como destacou Braga, “ambos compartilhavam o objetivo de destruir a ordem liberal europeia. Hitler queria expandir o Lebensraum (espaço vital), e Stalin buscava revolução mundial”.
A cooperação incluiu:
- Treinamento militar: A Alemanha usou território soviético para testes de armas proibidos pelo Tratado de Versalhes.
- Comércio de recursos: A URSS forneceu petróleo, trigo e minérios em troca de máquinas industriais nazistas.
- Repressão política: A NKVD (polícia secreta soviética) e a Gestapo trocaram informações para perseguir dissidentes.
A Farsa da Neutralidade Ideológica
Braga desmontou a tese de que o pacto foi uma “jogada estratégica” de Stalin para ganhar tempo: “Documentos dos arquivos soviéticos mostram que Stalin admirava a eficiência militar nazista. Em 1940, ele chegou a propor a entrada da URSS no Eixo Roma-Berlim-Tóquio”.
Um trecho do livro Stalin: Nova Biografia (Oleg Khlevniuk) foi citado: “Stalin via Hitler como um aliado útil para desestabilizar o capitalismo. Sua queda só interessou aos soviéticos quando a Alemanha virou-se contra eles em 1941”.
A Revolução Russa: Mitos e Realidades
Antes de abordar o pacto, Braga dedicou parte da entrevista para desconstruir narrativas sobre a Revolução de 1917:
1. O “Apoio Popular”
A ideia de que a Revolução Russa teve apoio massivo foi classificada como “propaganda perpetuada por décadas”. Dados apresentados:
- “Em Petrogrado, epicentro da revolução, havia 30 a 40 mil manifestantes em uma população de 150 milhões”1.
- “Mais da metade eram soldados insatisfeitos com a Primeira Guerra Mundial, não operários ou camponeses”1.
2. Abertura de Arquivos Soviéticos
Com a queda da URSS em 1991, documentos secretos revelaram:
- “A fome na Ucrânia (Holodomor) foi planejada para sufocar nacionalismos”1.
- “Stalin autorizou pessoalmente execuções em massa durante o Grande Expurgo”1.
Braga criticou a falta de acesso a fontes primárias no Brasil: “Enquanto estudiosos globais debatem com base em arquivos, aqui ainda se ensina que a URSS era um paraíso proletário”.
O Papel da Propaganda na Sustentação dos Regimes
A análise destacou como nazistas e soviéticos usaram técnicas similares de manipulação:
Culto à Personalidade
- Hitler: “Era retratado como o salvador da Alemanha contra o caos comunista”.
- Stalin: “A propaganda soviética o chamava de ‘Pai dos Povos’, apesar dos gulags”1.
Inimigos Comuns
Ambos regimes usaram bodes expiatórios para justificar repressão:
- “Judeus, capitalistas e democracias liberais eram inimigos do nazismo”.
- “Kulaks (camponeses ricos), ‘sabotadores’ e ‘agentes do Ocidente’ foram perseguidos na URSS”1.
Lições para o Presente
Ao final, Braga alertou: “Regimes totalitários podem parecer antagônicos, mas compartilham o desprezo por liberdades individuais. O pacto Hitler-Stalin prova que ideologias radicais negociam quando convém”.
Sobre a Rússia moderna, foi enfático: “Putin fechou arquivos e reescreve a história para glorificar o passado soviético. Quem controla o passado controla o futuro”